Wednesday, December 8, 2010

O Rio Neva pela manhã ...



Num dos meus passeios habituais por São Petersburgo,numa manhã de Verão.

Thursday, November 11, 2010

O Homem e o Mar











O Homem e o Mar

Homem livre, o oceano é um espelho fulgente
Que tu sempre hás-de amar. No seu dorso agitado,
Como em puro cristal, contemplas, retratado,
Teu íntimo sentir, teu coração ardente.

Gostas de te banhar na tua própria imagem.
Dás-lhe beijo até, e, às vezes, teus gemidos
Nem sentes, ao escutar os gritos doloridos,
As queixas que ele diz em mística linguagem.

Vós sois, ambos os dois, discretos tenebrosos;
Homem, ninguém sondou teus negros paroxismos,
Ó mar, ninguém conhece os teus fundos abismos;
Os segredos guardais, avaros, receosos!

E há séculos mil, séc'ulos inumeráveis,
Que os dois vos combateis n'uma luta selvagem,
De tal modo gostais n'uma luta selvagem,
Eternos lutador's ó irmãos implacáveis!

Charles Baudelaire, in "As Flores do Mal"




Tuesday, November 2, 2010







É Talvez o Último Dia da Minha Vida

É talvez o último dia da minha vida
Saudei o sol, levantando a mão direita,
Mas não o saudei, para lhe dizer adeus.
Fiz sinal de gostar de o ver ainda, mais nada.

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"

Aroma, Essência, Pólen, Harmonia…









Aroma, Essência, Pólen, Harmonia…

Eu que só gosto de vestidos velhos,
de velhas casas com paredes tortas,
de poeiras ancestrais, de cinzas mortas,
de desbotados rosas e vermelhos;

eu que só gosto de velhos quintais
com ásperas roseiras mal regadas;
de cortinas de rendas, passajadas
por velhos dedos com velhos dedais;

eu que só gosto de velhas gavetas,
de velhas malas com cetins puídos,
sedas, fitas, perfumes esquecidos,
leques, missais, raminhos de violetas;

eu que só quero o que ninguém cobiça,
oiros de sol e pratas de nevoeiros,
filigranas de flores nos canteiros,
folhas soltas que o vento desperdiça,

espuma de marés, conchas vazias,
cintilações de estrelas, céus distantes,
gotas de orvalho – frescos diamantes,
canções de búzios – verdes melodias;

eu que só peço a Deus o que sobeja
de humanas ambições e vãs partilhas,
continentes de luar, sonhadas ilhas,
nuvens de fumo que ninguém deseja;

eu que só quero a rude sinfonia
do vento à solta, e os dedos de veludo
da chuva nos beirais da minha rua,
aroma, essência, pólen, harmonia,
eu, que não quero nada,
quero tudo:
quero a Poesia.

Fernanda de Castro, in «Exílio», 1952


Sunday, October 31, 2010

Em uma Tarde de Outono


Em uma Tarde de Outono

Outono. Em frente ao mar. Escancaro as janelas
Sobre o jardim calado, e as águas miro, absorto.
Outono... Rodopiando, as folhas amarelas
...Rolam, caem. Viuvez, velhice, desconforto...

Por que, belo navio, ao clarão das estrelas,
Visitaste este mar inabitado e morto,
Se logo, ao vir do vento, abriste ao vento as velas,
Se logo, ao vir da luz, abandonaste o porto?

A água cantou. Rodeava, aos beijos, os teus flancos
A espuma, desmanchada em riso e flocos brancos...
Mas chegaste com a noite, e fugiste com o sol!

E eu olho o céu deserto, e vejo o oceano triste,
E contemplo o lugar por onde te sumiste,
Banhado no clarão nascente do arrebol...

Olavo Bilac, in "Poesias"

Friday, October 29, 2010

Querem uma Luz Melhor que a do Sol!



Esta foto pertence a uma coleção de fotos minhas
que eu tirei a um
magnifico por de sol em Tallin na Estonia
a 27 de Julho de 2010



AH! QUEREM uma luz melhor que
a do Sol!
Querem prados mais verdes do que estes!
Querem flores mais belas do que estas
que vejo!
A mim este Sol, estes prados, estas flores contentam-me.
Mas, se acaso me descontentam,
O que quero é um sol mais sol
que o Sol,
O que quero é prados mais prados
que estes prados,
O que quero é flores mais estas flores
que estas flores -
Tudo mais ideal do que é do mesmo modo e da mesma maneira!

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"

Saturday, October 23, 2010

NÃO DESISTAS DE MIM - PEDRO ABRUNHOSA

Todas as fotos deste slide são de minha autoria





A Minha Ausência de Ti
Foi tal e qual o inverno a minha ausência
de ti, prazer dum ano fugitivo:
dias nocturnos, gelos, inclemência;
que nudez de dezembro o frio vivo.
E esse tempo de exílio era o do verão;
era a excessiva gravidez do outono
com a volúpia de maio em cada grão:
um seio viúvo, sem senhor nem dono.
Essa posteridade em seu esplendor
uma esperança de órfãos me parecia:
contigo ausente, o verão teu servidor
emudeceu as aves todo o dia.
Ou tanto as deprimiu, que a folha arfava
e no temor do inverno desmaiava.

William Shakespeare, in "Sonetos"

Thursday, October 21, 2010

A Palavra Mágica

...

A Palavra Mágica

Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.

Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.

Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.

Carlos Drummond de Andrade, in 'Discurso da Primavera'

Tuesday, October 19, 2010

Refugia-te na Arte







O Que Alguém Disse "Refugia-te na Arte" diz-me Alguém
"Eleva-te num vôo espiritual,
Esquece o teu amor, ri do teu mal,
Olhando-te a ti própria com desdém.

Só é grande e perfeito o que nos vem
Do que em nós é Divino e imortal!
Cega de luz e tonta de ideal
Busca em ti a Verdade e em mais ninguém!"

No poente doirado como a chama
Estas palavras morrem... E n'Aquele
Que é triste, como eu, fico a pensar...

O poente tem alma: sente e ama!
E, porque o sol é cor dos olhos d'Ele,
Eu fico olhando o sol, a soluçar...

Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"